A FLIP e Paraty precisam se reinventar












Terminou ontem a décima edição da FLIP. O consenso, entre as pessoas com quem falei, foi que 2012 não será lembrado como um dos anos mais marcantes do evento.
Entre os nomes mais aguardados, o francês J.M. G Le Clézio, deu o cano. Outro, o norte-americano Jonathan Franzen, botou o público para dormir em um dos debates mais chatos que já vi.
Ian McEwan, Javier Cercas e Ruy Castro fizeram debates interessantes e divertidos. Mas foi pouco.
A parceria entre a FLIP e Paraty é boa para todo mundo. A FLIP movimenta a economia local como nenhum outro evento, lotando pousadas e restaurantes e empregando muitos moradores. Já a FLIP se beneficia do charme e beleza da cidade, qualidades que atraem os turistas.
Agora que a festa completa dez anos, está na hora dela – e de Paraty – se reinventarem, sob pena de entrar num piloto automático entediante.
Acho que a maior qualidade da FLIP é ser um evento democrático. Já escrevi isso aqui: mesmo quem não tem ingresso para os debates consegue acompanhá-los, seja do telão ou do lado de fora da tenda do telão, onde dá para ver tudo numa boa.
A Flipinha também funciona bem. É muito bonito ver crianças das escolas da região tendo contatos com livros e autores, tudo de graça e num clima descontraído.
Por outro lado, a infra-estrutura precária de Paraty prejudica o evento.
Durante cinco dias, os 20 mil turistas que chegam à cidade precisam conviver com problemas que os moradores conhecem muito bem: saneamento básico inexistente, falta de água e luz, serviços de telefonia e internet de quinta categoria e dificuldades para estacionar.
Para uma cidade que vive do turismo, a precariedade do apoio ao turista é chocante: não há sinalização ou informações nas ruas. O centro de informações turísticas fica, inexplicavelmente, a 2 km do centro histórico. Grande parte dos restaurantes não aceita cartão de crédito e tem atendimento de tartaruga. As pousadas cobram tarifas exorbitantes e têm atendentes despreparados, que não sabem dar informações ou falar inglês.
Achar um lugar para comer sem uma fila de espera de pelo menos uma hora era tarefa das mais difíceis.
Conheço várias pessoas que deixaram de vir à FLIP porque não tinham mais condições de pagar as tarifas surreais pedidas pelas pousadas.
Se a cidade tivesse mais eventos bons como a FLIP, o Bourbon Fest (festival de blues e jazz) ou o Paraty em Foco (encontro de fotografia), talvez as pousadas lucrassem mais ao longo do ano e não precisassem extorquir os turistas desta maneira.
Paraty precisa urgentemente mudar de foco e perceber que seu forte é o turismo cultural, não o turismo de massa. É uma cidade pequena demais, charmosa demais e importante demais para sediar barbaridades como a Festa da Cachaça ou os shows de popstars (Michel Teló, Luan Santana) que têm rolado nos últimos anos.
A FLIP também precisa se reinventar.
Os debates com autores só funcionam quando estes conseguem falar bem sobre suas próprias obras, o que não é sempre o caso.
O ofício de escrever é solitário, e não é todo escritor que consegue transmitir, falando, as mesmas coisas que consegue pôr no papel.
Também acho inadmissível como um evento literário em 2012 pode ignorar temas tão em voga quanto o livro eletrônico e a autopublicação.
Sei que a FLIP depende das editoras e serve para editoras lançarem seus livros. Mas há uma massa de autores sem editoras por aí, e um debate sobre como publicar seu livro de forma independente teria um apelo enorme.
Tomara que a FLIP e a cidade de Paraty reflitam bastante sobre os acertos e os erros desses dez anos, para que os próximos dez sejam ainda melhores. Ficamos na torcida.